terça-feira, 29 de setembro de 2015

Capitã Marvel e o feminismo

A Marvel Comics publicou a última edição da minissérie Captain Marvel and the Carol Corps, e com isso encerrou a fase da roteirista Kelly Sue DeConnick à frente das histórias da Capitã Marvel, iniciada em julho de 2012. 

Nesses três anos, Kelly ganhou notoriedade como uma voz de expressão nos quadrinhos americanos e fez da personagem a principal figura de afirmação feminina de sua geração.

Desde sua origem, em 1968, no auge da segunda onda do movimento feminista, Carol Danvers foi criada pelo roteirista Roy Thomas e pelo desenhista Gene Colan, para espelhar nas HQs os esforços de mulheres que batalhavam para se inserir no mercado de trabalho. Carol sonhava em pilotar, apesar da resistência de seu pai, e por mérito próprio conseguiu um posto numa das instituições mais machistas do país, a Força Aérea Americana. Mesmo quando ganhou os superpoderes kree de Mar-vell, o Capitão Marvel, e se tornou a Miss Marvel em 1977, seu horizonte não mudou: para Carol Danvers o limite sempre foi o céu.

O que Kelly DeConnick fez ao assumir as histórias da personagem foi tornar mais latente esse discurso e deixar clara a emancipação de Carol Danvers. Durante anos, a personagem viveu à sombra do seu "criador" (ela devia seus poderes ao Capitão Marvel) e seu visual consagrado, musculosa, com máscara preta, botas e luvas e o laço amarrado na cintura, davam vazão a fantasias masculinas de masoquismo. No pacote da série Captain Marvel, vinha não só um visual menos masculinizado e um novo uniforme de corpo inteiro, mas principalmente uma nova postura de independência. 

É marcante o momento em Captain Marvel #1, antes de Carol aceitar a sugestão do Capitão América de assumir para si o codinome de Capitã Marvel, em que ela lembra que se aposentou como coronel, e portanto é hierarquicamente superior a Steve Rogers nas forças armadas.
Apesar da piada com a vitória das mulheres, Kelly não constrói sua Carol como uma revanchista. Essa função cabe a Helen Cobb, pioneira entre as mulheres na Força Aérea, ídola de Carol na juventude e uma das grandes personagens criadas pela roteirista nessa fase.

O fato de Kelly escolher, como primeiro arco de sua HQ, uma viagem no tempo que coloca Carol e Helen lado a lado num contexto de Segunda Guerra Mundial, é bastante emblemático da separação que a autora procura fazer entre o revanchismo de Helen e o heroísmo de Carol. Na relação de aprendizagem e rivalidade entre as duas, a série estabelece o cenário não para uma vitória da mulher mas para uma convocação à irmandade. 

Ao longo desses três anos, em que Captain Marvel nunca vendeu edições no mesmo nível dos blockbusters da editora, um pequeno culto se formou entre leitores e leitoras nos EUA, grupo chamado "Carol Corps" e frequenta Comic-Cons com cosplays da nova Capitã Marvel. Essa base de fãs responde, antes de mais nada, a uma estratégia de Kelly de tornar Carol Danvers a porta-voz de um grupo. Ainda no arco ambientado na Segunda Guerra, a Capitã Marvel lidera um pelotão de mulheres no front, e, entre outras coisas, ensina a elas a odiar não os homens mas o sistema ("o seu inimigo é a guerra", ela diz), num confronto oportunamente feito contra máquinas e não contra outros humanos. 

As primeiras 17 edições dessa fase terminam coroando a nova postura da heroína como uma porta-bandeiras, inspirando crianças e adolescentes. Desde sempre, não há nada mais representativo do sucesso de um personagem da Marvel do que a cena, na edição 17, em que a população de Nova York se põe na linha de fogo para defender seu super-herói de preferência, e Carol Danvers fez por merecer.

Fonte: Omelete

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